Anatomicamente, uma junção gastroesofágica (JGE) intacta, composta por um esfíncter
esofágico inferior e um pilar diafragmático sobrepostos, é um dos principais mecanismos de
defesa para evitar o refluxo gastroesofágico (RGE). Caso essa barreira seja comprometida,
os sintomas de RGE, como azia, desconforto torácico, regurgitação e sintomas
extraesofágicos, como tosse ou dor de garganta, podem aumentar. RGE de longo prazo ou
persistente pode resultar em problemas como esôfago de Barrett, desenvolvimento de
estenose e esofagite erosiva. Considera-se que o esfíncter esofágico inferior e o pilar
diafragmático trabalham juntos anatomicamente para prevenir o refluxo, principalmente em
situações dinâmicas como pós-deglutição ou quando há aumento da pressão intra-
abdominal.
Quando há uma protrusão do estômago para a cavidade torácica, através do hiato
diafragmático, ocorre a hérnia de hiato. Um hiato diafragmático frouxo e a membrana
frenoesofágica são os principais fatores que contribuem para a formação dessa hérnia, seja
ela hiatal ou paraesofágica. Essas falhas causam ruptura da barreira normal do RGE,
permitindo a migração do estômago cranialmente, seja anatomicamente (hiatal) ou não
anatomicamente (paraesofágica). A grande maioria das hérnias diafragmáticas são hérnias
hiatais, enquanto 5% a 10% são hérnias paraesofágicas.
As hérnias diafragmáticas podem ser classificadas como:
Hiatal (tipo I ou “tipo deslizante”), onde a JGE é deslocado cranialmente acima do hiato
diafragmático com uma porção da cárdia
Paraesofágicas (tipos II-IV), onde defeitos na membrana frenoesofágica permitem a
migração do estômago ou outras estruturas próximas à JGE.
− Na hérnia tipo II, a JGE permanece no nível do diafragma, mas uma porção do
fundo gástrico migra através da membrana frenoesofágica para o mediastino.
− As hérnias paraesofágicas do tipo III, muitas vezes referidas como “tipo misto”, têm
elementos do tipo I e do tipo II, onde a JGE é deslocada cranialmente, mas também
há um defeito na membrana frenoesofágica com deslocamento fúndico adjacente
ao esfincter inferior.
− Uma hérnia paraesofágica tipo IV é diagnosticada quando estruturas não gástricas
herniam através da membrana frenoesofágica, incluindo baço, cólon, intestino
delgado ou pâncreas.
Clinicamente, as hérnias hiatais são frequentemente assintomáticas e frequentemente
encontradas na endoscopia de rotina. Nesse caso, nenhuma terapêutica é indicada. No
entanto, a hérnia hiatal pode levar a sintomas de DRGE, incluindo azia, regurgitação e
disfagia. A presença de uma hérnia deve ser investigada se os sintomas clínicos estiverem
presentes, especialmente se a terapia medicamentosa típica para DRGE não resolver os
sintomas apresentados. O diagnóstico pode ser feito com várias modalidades, incluindo
endoscopia digestiva alta, EED, tomografia computadorizada e manometria esofágica, sendo
que cada método apresenta suas vantagens e desvantagens.
O tratamento deve ser focado no manejo dos sintomas com Inibidores de bomba de prótons
(IBPs) e, se os sintomas não responderem à terapia típica, especialmente se a regurgitação
ou disfagia for a apresentação predominante, o tratamento cirúrgico deve ser considerado.
As hérnias paraesofágicas são menos comuns, mas também podem causar sintomas e ter
potencial para ocasionar um volvo ou obstrução. As hérnias sintomáticas do tipo II e III que
não respondem à terapia medicamentosa devem ser tratadas cirurgicamente, assim como
as hérnias do tipo IV. Uma abordagem expectante pode ser considerada para hérnias
paraesofágicas assintomáticas. A recorrência de hérnias hiatais é comum após a correção
cirúrgica, ocorrendo em até 50%, dependendo do tamanho inicial da hérnia; assim, a escolha
pela intervenção cirúrgica deve ser feita com cautela, com atenção especial para garantir a
probabilidade de sucesso cirúrgico para os sintomas refratários.
REFERÊNCIAS:
Callaway JP, Vaezi MF. Hiatal and Paraesophageal Hernias. Clin Gastroenterol Hepatol.
2018 Jun;16(6):810-813. doi: 10.1016/j.cgh.2017.12.045. Epub 2018 Jan 3. PMID: 29306040.